Mortas as palavras, garganta
seca, restava esperar que a escuridão os conduzisse ao sono. Era quase verão e
a desesperança tinha atravessado três estações para chegar ao limite do
cansaço. E sendo a realidade das faces comprometedora e demasiado fria,
deram-se as costas para o equilíbrio da estranha balança que os sustentava. Já
não eram senão o vulto opaco que o tempo tatuara na memória; um copo pela boca
à espera da última gota. E o silêncio, a pesar sobre os pesares.
Mas naquela noite, instante
suspenso de uma tormenta, algo incomum atravessou os anteparos. Desvelada, a
dormência se fez movimento e em busca de trégua, navegou os lençóis. O coração
disparou, faltou o ar, sumiu o chão. E como náufragos, boiaram sob o céu
constelado em busca de um único gesto que os salvasse. As mãos, até então
recolhidas, deslizaram. Pétala de delicada textura, a pele cedeu aos afagos. E
o vazio ao lado se dissipou.
M.Cendón
foto: Marga Cendón
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