Naquele
dia, algo diferente moveu-se na contraluz do fim da tarde, hora em que os
fantasmas, misteriosamente, tomavam conta da varanda. Não era a brisa de maio
sacudindo os eucaliptos que margeavam o caminho, nem sonho, miragem ou fruto do
delírio de proximidade que há muito lhe roubara o sono. Apurou a vista em
direção ao vulto e de longe reconheceu o passo. Cansada das lições de espera
impostas pelo silêncio, correu ao seu encontro. Cerrou as pálpebras e, como
cega, tocou-lhe a face com a palma das lembranças. A barba por fazer e os sulcos
que o tempo havia desenhado não confundiram as pontas dos seus dedos. Ela o
reconheceria, entre mil outros, ainda que mil anos os tivessem separado.
M.Cendón
foto: Marga Cendón
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